Incertezas sobre a contraofensiva de Kiev contra os russos
Apesar de a Ucrânia anunciar há meses uma contraofensiva para recuperar os territórios conquistados pela Rússia, ninguém pode dizer com certeza se realmente começou, enquanto continuam os combates e as declarações.
Após a ofensiva russa deste inverno, que não teve grandes efeitos na linha de frente, o Ocidente espera que Kiev recupere a iniciativa no plano militar.
- Bakhmut, o epicentro -
A batalha pela cidade de Bakhmut, na região do Donbass, é a mais sangrenta e longa desde que começou a invasão russa em 24 de fevereiro de 2022.
A Ucrânia disse no domingo ter retomado "mais de dez posições russas" nos arredores de Bakhmut (leste), epicentro dos combates há vários meses e cenário nos últimos dias de um avanço ucraniano pelos laterais das defesas russas.
Kiev afirma ter avançado nos arredores de Bakhmut, pela primeira vez em vários meses, enquanto a Rússia disse estar avançando na própria cidade, que controla em sua maior parte.
"Eu me inclinaria pela interpretação de que a Ucrânia está tentando fixar as forças russas em Bakhmut, para obrigá-las a permanecer em um ponto definido da linha de frente enquanto as tropas ucranianas consideram várias zonas" para atacar, aponta Ivan Klyszcz, investigador do Centro Internacional de Defesa e Segurança (ICDS) da Estônia.
- A Rússia está preparada -
As forças russas passaram há várias semanas a uma estratégia defensiva, com uma defesa de mais de 800 quilômetros, às vezes de três linhas de profundidade, e um grande número de soldados para mantê-las.
Este dispositivo inclui valas antitanques, cercas, linhas de defesa pré-fabricadas como os chamados "dentes de dragão" (pequenas pirâmides antitanques de concreto) e trincheiras para soldados.
Por isso, a contraofensiva será muito mortal e cara em equipamentos para o Exército da Ucrânia.
Porém, é possível que os ucranianos já tenham realizado alguns exercícios para avaliar a eficácia das defesas russas.
"A Ucrânia já realizou contraofensivas locais em Bakhmut e seus arredores para fazer os russos recuarem e avaliarem as defesas da região", afirma Lucas Webber, cofundador do site web especializado em investigação Militant Wire.
"É difícil dizer se a contraofensiva real planejada já começou, mas estas ações sugerem que a Ucrânia está planejando algo muito maior", afirma.
- Várias possibilidades -
O grande comprimento da linha de frente não deixa claro o local escolhido para atacar a Ucrânia. A própria cidade de Bakhmut pode não ter interesse estratégico suficiente.
Porém, um contra-ataque no local "seria vergonhoso para o Kremlin e [o grupo paramilitar] Wagner, que já quase tomaram a cidade", disse Lucas Webber.
Kiev também poderia tentar liberar a central nuclear de Zaporizhzhia, no sudeste.
Há uma semana, o diretor da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), Rafael Grossi, expressou sua preocupação com uma situação "cada vez mais imprevisível e potencialmente perigosa" em torno da usina.
- Manipulações -
Como em todas as guerras, "cada parte está provavelmente tentando pressionar a outra para convencê-la a atacar onde parece mais frágil", observa Pierre Razoux, diretor acadêmico da Fundação Mediterrânea de Estudos Estratégicos (FMES).
Indica que "as fases preparatórias da ação clandestina e da manobra de distração parecem estar muito avançadas em ambas as partes".
"Prova disso são as sabotagens cada vez mais frequentes em território russo próximo ao front e os ataques russos contra depósitos ucranianos de armas e munições", aponta.
As tentativas de desestabilizar o país estão em andamento por ambas as partes.
No domingo, o diário americano Washington Post, citando documentos confidenciais obtidos em um vazamento maciço no mês passado, afirmou que Yevgueni Prigozhin, o chefe do Wagner, ofereceu à Inteligência ucraniana informações sobre a localização de unidades do Exército russo em troca da retirada das forças de Kiev de Bakhmut.
Uma informação qualificada por Prigozhin, confrontado pelo Estado-Maior do Exército Russo, como "ridícula".
M.P.Huber--MP